Quando o relógio digital, colocado numa das paredes do bar, zerou, foram abertas as portas da sala e o público que aguardava também fora da casa, começou a entrar. Uma música incidental entoava lamentos e gemidos, num som oscilante, como um mantra. O piso da sala coberto com folhas de árvores parecia áspero como chão de terra, estranhamente, os sapatos deslizavam nele. As paredes estavam cobertas por plantas trepadeiras, algumas pessoas viram lagartixas correrem entre as folhas. A sensação era de que tinham saído e não entrado em algum lugar. No teto da sala estava projetado um céu cinza, as nuvens se movimentando para desabarem em chuva. Alguns ficaram confusos achando que não havia cobertura acima de suas cabeças. A sensação era de expectativa. Parecia que a qualquer momento iria ocorrer algo. O medo foi contagiando a todos e transformando-se em energia, misturada ao som tecno. Muitos passaram a pedir aos garçons, bebidas fortes.
Bonnie dançava e a todo momento olhava para trás. Sentia um arrepio nas costas. Poderia ser o ar gelado que vinha do corredor que levava aos banheiros. Patrícia conhecera um tal de Syd, entraram juntos num dos corredores subterrâneos que levava aos toaletes e não voltaram. O homem grisalho sentado no bar não parava de olhar para ela. Era alto, magro e deveria ter uns cinqüenta anos. Ela impacientava-se com a demora da amiga e a hesitação do homem do bar. Será que aceitaria se o convidasse para dançar? Não iria atrás da amiga naquele corredor sombrio. Não sentia-se a vontade naquele lugar.
A temperatura estava muito alta para a estação, primavera tórrida, sensação térmica de quarenta e sete graus. A bolha de calor se formara devido ao fortalecimento do ar seco na atmosfera, caprichos do El niño. A poluição exigia esforço para respirar. Os olhos lacrimejavam e o nariz ardia. A população da grande cidade já sofria as conseqüências do número excessivo de veículos nas ruas. A mobilidade era o problema e o rodízio dos carros nas avenidas a solução provisória. A calamidade era iminente, faltava água, há meses não chovia. Até para aqueles que viviam nos subterrâneos da cidade a seca estava afetando suas vidas e seu habitat já sofria modificações. A secura já invadia os cantos escondidos pela escuridão. Quando saiam à noite para caçar, o bafo quente aderia suas peles sensíveis e a fumaça no ar, tornava o cenário ideal para aqu...
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