Pular para o conteúdo principal

Aparição II

      Assistir as aulas no horário da manhã era como estar num território alfa, entre um sobressalto e outro despertava do cochilo e fazia as anotações de biologia. No final das aulas, já acordada, ia animada e com fome para casa. Três vezes por semana estudava com Victor no final da tarde, nos outros dias se virava sozinha. Naquela terça-feira tinham combinado estudarem matemática que era mais um enigma na sua vida e para o amigo, algo elementar. Ficaram revisando a matéria até mais tarde, porque estavam no período das provas de final de ano e tudo ficava mais difícil. Quando saiu do apartamento de Victor não apertou o interruptor da luz e ficou envolta na escuridão do corredor, ficou com medo de ter que caminhar alguns passos na direção contrária para apertá-lo, pensou em sair correndo e subir as escadas até o seu andar, o elevador era uma opção mais assustadora ainda. Olhava para as paredes buscando algum apoio e não conseguia enxergar, quando esticava o braço para tocá-la, tinha a impressão de que ia se distanciando, parecia elástica. Ficou sem referência e em pânico, correu para as escadas, olhou para trás antes de subir, porque escutou um som que parecia um chiado se aproximando. Viu algo fosforescente que saia da parede e planava pelo breu do corredor indo na sua direção. Congelou. No mesmo instante acenderam a luz do andar de cima e Ella conseguiu voltar a correr e só parou ao chegar em casa.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Apêndice

                                                                                                                                             O que dizer dessas pessoas que sentem que não se encaixam nas ações cotidianas? Não conseguem sentir da mesma forma aquilo que os outros sentem em relação a diversão e visão de mundo...        São extraterrestres, não são vistos como tal, mas essa sensação lhes habita. Conseguem de forma mimética fazer parte, muitas vezes...

Bolha de Calor

              A temperatura estava muito alta para a estação, primavera tórrida, sensação térmica de quarenta e sete graus. A bolha de calor se formara devido ao fortalecimento do ar seco na atmosfera, caprichos do El niño. A poluição exigia esforço para respirar. Os olhos lacrimejavam e o nariz ardia. A população da grande cidade já sofria as conseqüências do número excessivo de veículos nas ruas. A mobilidade era o problema e o rodízio dos carros nas avenidas a solução provisória.        A   calamidade era iminente, faltava água, há meses não chovia.        Até para aqueles que viviam nos subterrâneos da cidade a seca estava afetando suas vidas e seu habitat já sofria modificações. A secura já invadia os cantos escondidos pela escuridão. Quando saiam à noite para caçar, o bafo quente aderia   suas peles sensíveis e a fumaça no ar, tornava o cenário ideal para aqu...

Aparição II

Estudaram durante duas horas quentes, regadas com muita limonada gelada. Quando saiu do apartamento às oito da noite, ainda estava tudo claro no corredor, ainda bem, pensou consigo mesma, quando fez o percurso de volta. Começou a entender que os sais por exemplo, eram substâncias iônicas e que existiam vários tipos, além do utilizado na cozinha. O Victor tinha um jeitinho de tornar simples as matérias que pareciam complicadas. Depois daquelas horas massacrantes iria dar uma relaxada, após a janta, relendo Aparição, adorava aquela história. O ambiente, a época, conseguia ter as mesmas sensações do personagem. Morava numa cidade, em que as noites de inverno eram frias e úmidas e em muitas havia aquela cerração que lembrava o fog londrino. Ella adorava essas noites em que poderia acontecer qualquer coisa, bastava dobrar umas das esquinas das ruas dos armazéns da área portuária. Lá a população era noturna e freqüentadora de bares e pensões encardidas que ficavam a margem do rio. Todos par...